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    Insurgência Reconstrução Democrática
  • 18 de nov.
  • 8 min de leitura
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1. A 30ª Conferência das Partes do Acordo do Clima da ONU, a COP-30, realiza-se num contexto alarmante: as emissões de gases do efeito estufa jamais foram tão grandes. O ano de 2023 registrou uma temperatura média global 1,48°C acima do nível pré-industrial e o ano de 2024, o mais quente já registrado, teve uma temperatura média 1,6°C acima do nível pré-industrial. Os dez últimos anos foram os mais quentes já observados e o cenário previsto é de temperaturas entre 2,5°C e 3°C na segunda metade desse século.

 

2. Dos nove indicadores de sustentabilidade ecológica, sete já foram ultrapassados: clima, biodiversidade, ciclos de nitrogênio e fósforo, água doce, uso da terra, poluição química e mais recentemente, a acidificação dos oceanos. Ultrapassar essas fronteiras climáticas significa conviver com consequências devastadoras. Para a humanidade: fome, sede, guerras por água e alimentos, bilhões de refugiados climáticos. A mudança climática - agora uma Emergência - é o aspecto mais perigoso e dramático da crise ecológica. Uma ameaça sem precedentes na história. É contra ela que estamos lutando. Afirmamos o projeto ecossocialista como uma alternativa ao Ecocídio e à barbárie. Em defesa de um clima o mais seguro ainda possível. Em defesa da vida, da humanidade e do planeta. 

 

3. Nosso objetivo em Belém é somar esforços para avançar em uma alternativa à destruição ambiental, pondo um fim ao verdadeiro responsável por ela, o sistema capitalista. É papel dos ecossocialistas durante a COP 30, construir uma coalizão de movimentos e atores que afirmam que é necessário “mudar o sistema, não o clima”. Movimentos sociais, povos indígenas e comunidades tradicionais, guardiãs e guardiões dos nossos biomas, mares e áreas verdes urbanas estarão reunidos na Cúpula dos Povos, paralela à Conferência oficial, para afirmar que as verdadeiras soluções vêm dos territórios, das práticas agroecológicas e da organização popular. 

 

4. A extrema direita tem uma agenda autoritária, ultraliberal e negacionista, e com seu projeto de morte. Num contexto de guerras militares e comerciais, ela segue como força polarizadora no Brasil e no mundo. Esvazia os mecanismos multilaterais e se opõe a qualquer acordo internacional sobre o clima e a biodiversidade. A ausência do governo Trump na COP-30, após ter retirado o país do Acordo de Paris, enfraquece os mecanismos multilaterais, demonstra seu desprezo pela agenda climática e a boicota.  

 

5. A COP pouco avançará no compromisso da redução de emissão global de carbono, seja pela ausência de grandes responsáveis pelas emissões globais de carbono, como os EUA, seja pelas limitações colocadas nas negociações que se anunciam. Encabeçadas pelo Brasil, elas abandonaram os objetivos firmados no Acordo de Paris, em 2015. Segundo o presidente da Conferência, André Correa do Lago, essa deve ser a COP da adaptação aos impactos das mudanças climáticas. Isso significa que o esforço principal não estará mais concentrado em impedir a elevação da temperatura, mas em minimizar os danos que continuarão escalando à medida que o calor aumenta. A adaptação é necessária nas políticas ambientais, mas não deve ser feita em detrimento da redução das emissões de carbono. Como afirma Michael Löwy, “dar prioridade à ‘adaptação’ em vez da ‘prevenção’ é uma forma indireta de se resignar à inevitabilidade das mudanças climáticas”.


COP de frustração em frustração


6. As COPs não têm sido capazes de costurar acordos palpáveis de redução de emissões CO2, graças ao lobby do complexo fóssil-mineral-agrário e seus governos subalternos. Os países ricos recusam-se a assumir sua responsabilidade histórica pelas emissões acumuladas e pressionam os países do Sul Global a "fazerem sua parte". As Contribuições Nacionalmente Determinadas (para redução das emissões de cada país, ou NDCs) são voluntárias, e não obrigatórias.


7. Sendo assim, a União Europeia está recuando de seus planos climáticos, argumentando que tem que priorizar os gastos com sua indústria armamentista. A China, hoje maior responsável global pela emissão de CO2, segue com metas tímidas de redução. É a ilusão do progresso incremental. O cenário que estas NDCs apontam é para temperaturas entre 2,5°C e 3°C acima da média pré-industrial na segunda metade desse século.

 

8. Em 2023, a COP-28 terminou com uma declaração de que o mundo teria que fazer uma transição para se distanciar do uso de combustíveis fósseis, mas não estabeleceu metas para que isso acontecesse. A transição energética é um dos temas que será discutido na COP-30, mas não há um mandato oficial para que a conferência determine metas ou prazos para que essa transição ocorra. Denunciamos a farsa da “transição energética”, na verdade uma “transação energética”. Patrocinados por empresas do setor de energia, inclusive as vinculadas a grandes petroleiras, fundos de investimento e governos que lhes dão largos incentivos fiscais, projetos de energia eólica e fotovoltaica sacrificam territórios e seus modos de vida, mantendo o mesmo padrão de pobreza energética das comunidades, para “descarbonizar” a Europa.

 

9. As energias renováveis não substituem as fontes fósseis, mas se somam a elas. Assim, as emissões seguem aumentando mesmo com o crescimento das fontes alternativas. Fontes alternativas são um caminho; mas, sem mudar o modelo em que os mais pobres e as comunidades seguem pagando a conta dos prejuízos que foram causados por quem lucra com esse mesmo modelo, essas alternativas ficam em xeque. Defendemos uma transição energética justa e inclusiva, sem levar a dinâmicas de destruição e desarticulação de ecossistemas marinhos e costeiros e com a escuta de quem verdadeiramente tem cuidado e preservado os territórios.

 

10. Outro aspecto preocupante é o da comercialização das florestas tropicais. A aposta do Brasil na COP-30 passou a ser a de negociar um novo instrumento financeiro) o TFFF). Por ele, os países que preservam as florestas tropicais serão recompensados por meio de um fundo de investimento global, o que é, em tese, positivo. No entanto, o modelo transforma o cuidado da natureza em mercadoria e o atrela ao sistema financeiro, o que traz riscos às soberanias nacionais, à medida que grandes corporações passam a ter relações econômicas diretas com territórios e biomas, e compromete autonomia dos movimentos que lutam pela salvaguarda das florestas e demais territórios. Como afirma a Assembleia Mundial pela Amazônia, “o TFFF considera, de forma equivocada e enganosa, que o desmatamento é uma falha de mercado que será resolvida atribuindo um preço aos serviços ecossistêmicos das florestas tropicais para atrair investimentos privados. O colapso ecológico provocado pelo capitalismo não será resolvido com mais capitalismo! O TFFF não reconhece as florestas como sistemas vivos que têm direito à vida, à preservação de seus ciclos vitais, à manutenção de sua capacidade de regeneração, a não serem contaminadas, a conservar sua integridade e a exigir reparação e restauração oportunas”. 


11. Na mesma perspectiva de submissão ao mercado, o mecanismo REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Floresta) permite que poluidores continuem poluindo. É um mecanismo de compensação, não de redução real. Mas a ciência é clara ao afirmar que não há como compensar emissões fósseis com florestas. O carbono fóssil, uma vez liberado, fica na atmosfera por séculos. As florestas podem queimar, secar, ser desmatadas. É uma falsa equivalência.


12. A Inteligência Artificial (IA), por sua vez, emerge como uma nova ameaça, como uma nova fronteira da destruição ecológica. Ela demanda enormes quantidades de água e energia para manterem seus centros de armazenamento de dados. Data centers e mineração de criptomoedas já consomem quase 2% da eletricidade mundial. Com a expansão da IA generativa (como ChatGPT, Gemini, etc.), esse consumo aumentará drasticamente. A IA reforça o racismo sistêmico (algoritmos treinados com dados enviesados), acelera a disseminação de desinformação e monopoliza a atenção humana, corroendo o tempo livre e as conexões sociais. Ela precisa ser socializada e democraticamente controlada.


Brasil perde oportunidade de ser liderança global pelo Clima


13. Apesar da grande esperança despertada pela realização da COP-30 em Belém, no coração da Amazônia brasileira, sob o governo Lula, a contradição está evidente. O governo anuncia a menor taxa de desmatamento na Amazônia desde 2017 e Lula, em seu discurso na Plenária Geral dos Líderes da Cúpula do Clima, reconhece a Amazônia como “símbolo maior da causa ambiental”, onde “correm milhares de rios e igarapés” e onde “habitam milhares de espécies de plantas e animais que compõem o bioma mais diverso da Terra”. Mas o mesmo presidente impulsiona a exploração de petróleo na foz do Amazonas, sob a justificativa de utilizar o do petróleo para o país “ser livre do combustível fóssil”, contrariando cientistas e ambientalistas que alertam sobre os riscos e impactos sobre comunidades e biomas. Uma falácia. 

 

14. A queima do petróleo do óleo da Margem Equatorial, que será basicamente exportado, pode liberar mais de 11 bilhões de toneladas de CO2, 5% do orçamento de carbono que restaria se fosse mantido o objetivo de limitar o aquecimento a 1,5°C. A iniciativa do governo terá impacto global negativo, em flagrante contradição com a agenda de transição anunciada pelo próprio presidente.  Organizações ambientalistas, povos e comunidades tradicionais atingidas denunciam um licenciamento atropelado, que põe em risco a biodiversidade, bem como os impactos climáticos do projeto. Não existe justiça quando povos e territórios são sacrificados. Não é possível conceber essa exploração como “desenvolvimento”. O mesmo modelo predatório, em outro momento da história, violentou povos originários em nome da “colonização”. A anulação da licença concedida pelo IBAMA é urgente e uma luta sem tréguas a ser travada ao longo desta COP.

 

A força que vem dos territórios: por justiça ambiental e climática!

 

15. Se as soluções para a crise climática não vêm dos mercados de carbono, dos governos cúmplices do capital ou das corporações que lucram com a destruição, de onde elas vêm? A resposta é clara e ressoa por todo o mundo: elas vêm dos territórios. Daí a importância da Cúpula dos Povos de Belém, que se reunirá paralelamente à COP-30. Entidades, redes e articulações brasileiras da sociedade civil, povos e comunidades organizadas, sem grandes expectativas com os interesses representados na Conferência oficial, e para desmascarar a farsa das grandes corporações, dos lobistas do petróleo e do agronegócio, dos governos pouco ou falsamente comprometidos com as transformações realmente necessárias, transmitirão uma mensagem poderosa para o mundo: "Justiça Climática: As Soluções Vêm dos Territórios”. Será essa força, a das mobilizações sociais, a única chance de arrancar medidas benéficas para o planeta. 

 

16. Conclamamos trabalhadoras, trabalhadores e o povo brasileiros a se juntarem a nós na construção de uma rede de proteção e na luta por um modelo de desenvolvimento que respeite os territórios, a vida, os saberes e a dignidade de todos os povos. Acreditamos que juntos podemos questionar os governos e o capital, criar condições para a superação do capitalismo e garantir um futuro com justiça ambiental, social e climática para as atuais e futuras gerações. O Manifesto da Via Campesina para a COP-30 vai na mesma linha.


17. Mais do que nunca, é hora de fazer ecoar para todo o planeta, as vozes de resistência a este modelo predatório, fossilista e espoliador, que envenena os territórios e mata tudo que tem vida. É hora de somar forças com os povos da floresta, com quem há milênios cuida da Amazônia, com indígenas, ribeirinhos, pescadores e marisqueiras, com os que sustentam seus modos de vida provando que há alternativa para além do Capital. É hora de fortalecer uma grande aliança global em defesa de uma alternativa realmente comprometida com uma transformação radical e a luta antissistêmica, pelo fim dos combustíveis fósseis, pela conservação dos ecossistemas, pela justiça ambiental, pela proteção dos territórios e modos de vida de tantos povos que seguem resistindo há séculos ao genocídio, ao ecocídio e ao etnocídio.

 

18. O “Manifesto Por Uma Revolução Ecossocialista” da IV Internacional deu a medida da urgência e da amplitude da mudança necessária: é preciso interromper já a marcha destruidora do “crescimento” capitalista. Longe do objetivo sempre anunciado de manter este “crescimento”, os países mais ricos precisam começar a reduzir a produção material e o uso de energia, para que os países mais pobres, que precisam satisfazer necessidades até agora não atendidas, possam ainda, por algum tempo, ampliar a produção. Mas a reorientação de rumos da economia, com a redução do consumo esbanjador da elite econômica e a adoção de medidas de redução da emissão de carbono (sem, de modo algum, ampliar a exploração de petróleo, muito menos na foz do Amazonas), precisa ser adotada em todo o mundo. Só uma revolução pode interromper a catástrofe em curso e salvar a humanidade do risco da extinção. Um novo rumo é cada vez mais urgente. O mundo será ecossocialista ou não será!


Declaração frente à COP-30 de Centelhas, Insurgência Reconstrução Democrática, MES e Rebelião Ecossocialista, correntes do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Brasil

 

Referências: [*] IV Internacional. (2025). Manifesto por uma revolução ecossocialista. Aprovado no 18º Congresso Mundial, fevereiro de 2025.


 
 
 
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    Insurgência Reconstrução Democrática
  • 31 de out.
  • 5 min de leitura
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A cena deveria chocar, mas é comemorada por amplos setores: dezenas de corpos enfileirados em praça pública, na favela Vila Cruzeiro, no complexo da Penha. Lá estão familiares, sobretudo mães, que choram pelos seus. O número de mortes varia: 119, 121, 130. A contagem parece não importar, assim como a vida de quem ali mora. No discurso do governador Cláudio Castro, a operação foi “um sucesso”: “de vítimas, só tivemos os policiais”, afirmou. Em coletiva, os responsáveis pela “megaoperação” - novo nome para a barbárie autorizada - usam de velho e poderoso discurso: gerar a total ausência de identificação pelos mortos, repetidamente chamados de “criminosos”, “terroristas” e "narcotraficantes”. 


Assim, alimentado pela desumanização, o expectador pode respirar aliviado e até mesmo aprender a valorizar a violência, passando a percebê-la como útil e necessária para a resolução dos graves problemas sociais. De um lado, os bárbaros inimigos; de outro, os heróis e salvadores. É o “sacrifício da justiça no altar da segurança”, anunciava Galeano. Engano dos discursos, o Rio de Janeiro não está mais seguro depois deste massacre.


O massacre reafirma um padrão de violência que tem caracterizado a gestão de Cláudio Castro, governador responsável por quatro das cinco operações mais assassinas já realizadas no Rio de Janeiro — superando, inclusive, seus próprios recordes anteriores. Um dos destaques anunciados pelo governo foi a apreensão de 93 fuzis. Deixou de afirmar que, no Sudeste, 3 em cada 4 apreensões de fuzis são de calibres disponibilizados entre Colecionadores, Atiradores Esportivos e Caçadores (CACs) durante o governo Bolsonaro; assim como, convenientemente, esqueceu que as maiores apreensões de armamento pesado no Brasil foram efetuadas sem um único tiro.


Esse modelo virou combustível político para alguns governadores. Ao invés de abordar as causas profundas da violência e, mais ainda, a preponderância de suas dimensões institucional e estrutural, o padrão de guerra apenas reforça o aparato de uma política criminal seletiva, direcionando o controle repressivo violento exclusivamente para as populações periféricas, majoritariamente negras e pobres. Bem sabemos que a indústria da droga é transnacional e só existe em interdependência com os Estados. Do mesmo modo, estamos cientes que operações como essas mantêm intactas as direções do narcotráfico e apenas descarta sua mão-de-obra barata, jovens trabalhadores do tráfico facilmente substituídos no dia seguinte.


Não há a construção de uma política que efetivamente reduza a ação de grupos milicianos ou facções nos territórios. São ações que, sob o disfarce de política pública, perpetuam práticas de um extermínio sem fim. O ciclo de violência é o resultado de uma escolha deliberada do Estado por uma estratégia de confronto militarizado que ignora princípios de legalidade e o valor da vida, principalmente de vidas negras e pobres. O ciclo de produção da vida no capitalismo também se faz com a produção de vidas precárias, desumanizadas, descartáveis. A produção de morte, especialmente em realidades de capitalismo dependente, como a nossa, é imprescindível para a sanha acumuladora e centralizadora de capital.


Nas movimentações do andar de cima, a direita e a extrema-direita fazem desse massacre o palanque. Mas não nos iludamos. Não há justificativa possível para que uma política estatal supostamente voltada à proteção da população se sustente na lógica do extermínio e que segurança pública. Segurança deveria significar preservação da vida e respeito aos direitos. O que está em jogo não é uma simples falha, mas a agudização do caráter bélico e racista do modelo de segurança pública brasileiro, em um contexto de aprofundamento da militarização das vidas. 


Ameaças inauditas ainda recaem sobre a população brasileira quando tomamos em conta que não só pelo discurso, mas também pelas práticas, o endosso ao desenho orquestrado para as incursões imperialistas estadunidenses se consuma: o inimigo como o narcoterrorista - aliás, classificação adotada por Milei para classificar o PCC e o CV, e que hoje se coloca em voga pelos patriotas que servem de capacho à ação estadunidense -, que nesse momento busca legitimar o posicionamento de tropas na costa venezuelana.


Precisamos denunciar o massacre de 28 de outubro como mais uma grave manifestação da agudização do genocídio ao povo negro no Brasil. Gritar, em todos os rincões do país, em alto e bom som, que chega de chacina e da política de extermínio, mas também reivindicar e batalhar por uma segurança cidadã e popular, que rompa com a falsa Guerra às drogas, que escolhe os corpos matáveis e não mexe um milímetro em quem controla o tráfico, de fato, representado pelo poder da Faria Lima e de parte considerável do Congresso Nacional. 


Cada corpo tombado é um grito que clama por vida, dignidade e memória. Não podemos naturalizar o massacre de vidas negras, pobres e faveladas, nem aceitar que o Estado siga seu projeto de morte e trate a população como inimiga. O silêncio não irá nos proteger. 


Por fim, reforçamos as reivindicações apresentadas pelos movimentos negros e demais organizações, em Manifesto da Coalizão Negra por Direitos, descritas a seguir:


  • A imediata responsabilização civil, penal e administrativa do governador Cláudio Castro e das autoridades diretamente envolvidas na operação;

  • A instauração de Inquérito pela Polícia Federal para investigação dos fatos com base na Lei 10446/2002, art. 1, inciso III;

  • A instauração de uma investigação independente e urgente, com acompanhamento da Defensoria Pública Federal, do Ministério Público Federal, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e de organismos internacionais de direitos humanos; 

  • Implementação de um plano nacional de ações coordenadas e de inteligência, com foco no rastreamento e controle do fluxo de armas e munições, na asfixia financeira das redes do crime organizado e na ampliação das investigações sobre toda a cadeia econômica, política e institucional que sustenta essas organizações, indo muito além das facções e alcançando seus vínculos com agentes públicos, empresas, milícias e grupos econômicos beneficiados pela economia da guerra;

  • A suspensão imediata de operações letais nas favelas e periferias do Rio de Janeiro;

  • A presença de observadores internacionais e nacionais da ONU, da OEA e de organizações de direitos humanos para acompanhar as investigações e assegurar transparência;

  • Independência das perícias, garantindo participação de peritos da Defensoria Pública e observadores independentes de órgãos internacionais;

  • Reparação integral às famílias das vítimas, com reconhecimento público da responsabilidade do Estado e medidas efetivas de não repetição;

  • A elaboração de políticas de atenção, cuidado e acesso à justiça para as vítimas da violência do estado e medidas para reparação comunitária, cujo os recursos orçamentários devem ser tirados do Fundo de Direitos Difusos e Coletivos do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que deve ser descontingenciado para atender a demanda das comunidades atingidas, incluindo auxílio para traslado de corpos para outros estados;

  • A construção de Protocolo sobre o funcionamento contínuo das câmeras nas fardas policiais.


Chega de massacre! Extermínio não é segurança pública!

Pela vida do povo negro e pobre desse país, contra o genocídio!


Insurgência Reconstrução Democrática

 
 
 
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    Insurgência Reconstrução Democrática
  • 24 de set.
  • 6 min de leitura
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A primavera do Hemisfério Sul começou um dia antes no Brasil. No domingo, 21 de setembro, cerca de cem cidades do país – entre as quais as grandes capitais São Paulo, Salvador, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza, Porto Alegre, Recife e Brasília – viram algo inédito nos últimos anos: o ativismo, a esquerda e os movimentos sociais nas ruas e praças, junto a um setor popular mais amplo, igualmente indignado com duas medidas votadas pela Câmara dos Deputados: a aprovação apressada da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que impediria investigações e punições de qualquer tipo a parlamentares durante seus mandatos – a “PEC da Bandidagem” - e a aprovação do regime de urgência da anistia aos envolvidos no golpe de 2022-2023.


A investida reacionária das direitas no Congresso foi uma resposta à condenação de Bolsonaro e sete cúmplices do núcleo central da trama golpista de 2022-2023, pelo Supremo Tribunal Federal. Bolsonaro e seus auxiliares-cúmplices na intentona autoritária – que incluiu um plano para assassinar Lula, seu vice, Alckmin, e o magistrado Alexandre de Moraes – foram condenados a mais de década na prisão. O julgamento e o veredito foram festejados por governos democráticos, movimentos sociais e imprensa não fascista de várias partes do mundo. Mas no terreno doméstico, os neofascistas não ficaram parados.


A extrema direita fez um acordo com a direita oligárquica tradicional reunida no Centrão para aprovação das duas medidas, garantindo um placar aproximado de 350 em 513 parlamentares.  


Vantagem frente às manifestações da extrema direita


Os atos de São Paulo e do Rio foram os mais fortes desde as mobilizações pelo Fora Bolsonaro, entre 2021 e 2022, e da concentração de festejo da vitória de Lula na Paulista, em outubro de 2022.  


Uma contabilidade extremamente cuidadosa aponta para a participação de mais de 600 mil pessoas nos atos – número que pode aumentar à medida que sejam contados os manifestantes em cidades do interior de estados populosos como São Paulo e Minas Gerais. Na comparação com os atos da extrema direita (o “bolsonarismo”) realizados dia 7 de setembro – para defender a anistia –, os protestos democráticos de domingo levaram ampla vantagem, numérica e de qualidade. 


Convocados em menos de uma semana por uma “coalizão” de fato entre artistas progressistas e movimentos sociais – centrais sindicais, sindicatos independentes, movimentos de sem-teto, movimento negro –, depois de uma explosão de indignação nas redes sociais e um posicionamento contundente das principais mídias empresariais, os atos foram mais nacionalmente generalizados. As organizações que convocaram tiveram em seguida a adesão de partidos de esquerda (PSOL, PCdoB, PT, UP), nem tão de esquerda (PDT, PSB) e muita gente de camadas populares.


Apesar de uma participação ainda tímida da juventude, a marca desses atos foi um perfil mais alegre e cultural! Uma necessidade para que sejam agregadores e politizadores. Ainda que o mote fossem as duas votações, se viu nas manifestações apoio à agendas positivas como o fim da escala 6 x1, a taxação dos super ricos e a isenção de IR para quem ganha até 5 salários mínimos. 


A onda de protestos marcou uma inflexão na disputa política central no país, da esquerda ampla contra o neofascismo. Ainda com importante e ameaçadora base de massas, a extrema direita brasileira vinha se valendo, desde agosto, de uma aliança explícita, sem nenhum escrúpulo de dignidade, com o governo dos EUA, para conquistar à força a anistia com a qual pretendem livrar Bolsonaro e seus amigos militares e ex-subordinados civis da prisão. 


No ato de 7 de setembro em São Paulo, a extrema direita chegou a estender na avenida uma bandeira estadunidense de 20 metros de comprimento. Enquanto nos Estados Unidos, o deputado Eduardo Bolsonaro fazia abertas gestões com a Casa Branca para incrementar as sanções contra o país e os juízes do processo contra os golpistas, na Câmara de Deputados, na semana passada, os neofascistas concentraram esforços em negociar com o líder direitista da casa, Hugo Motta, a tramitação rápida da anistia. Nessa negociação, os partidários de Bolsonaro valeram-se de um interesse comum com o “Centrão” (proteger-se de processos do STF em casos de mal-uso do dinheiro do orçamento destinado a deputados) para parir a malfadada PEC da Bandidagem.


Calcularam mal. Se da briga “condenação de golpistas versus anistia” participavam mais diretamente o governo e sua base, outros partidos de esquerda e seu eleitorado, a ameaça de impunidade total para os “políticos” indignou e incendiou a raiva de camadas mais amplas da população. Num balanço conciso do domingo pré-primavera, a comentarista da rede Globo, Andrea Sadi, analisou: “As manifestações de domingo (21) contra a PEC que blinda parlamentares de processos e a anistia deixaram a Câmara dos Deputados exposta. Os atos foram uma resposta à aprovação da PEC da Blindagem e da urgência do projeto de lei da anistia.”


Primeiros resultados


Além de terem mostrado ser possível “furar a bolha” do campo democrático e atrair o povo para a rua, os atos também tiveram, segundo outros comentaristas da imprensa corporativa, duas conquistas simbólicas importantes na história recente do país polarizado. Com “ajuda” do ataque imperialista de Trump contra a economia e a soberania política do país, a esquerda recuperou para a luta (pelo menos por ora) a bandeira brasileira, há mais de dez anos mal utilizada pelos seguidores de Bolsonaro. Ao mesmo tempo, foi a primeira vez desde 2013 que a indignação anticorrupção no aparelho do estado foi capitaneada pelo movimento de massas progressista.


O resultado concreto da jornada dominical foi o sepultamento da PEC da Bandidagem no Senado, as promessas do presidente do Senado de que vai dificultar a tramitação da anistia e a tramitação da isenção de IR. Para além disso, recuperou-se o ânimo do ativismo e o PSOL também se legitima ao ser um dos poucos partidos que votaram 100% contra a proposta - 12 deputados do PT votaram a favor, demonstrando os limites das políticas de conciliação e adaptação que perpassam o partido. 


Nada disso – a não ser o ânimo renovado para continuar lutando – garante que Bolsonaro cumprirá a pena de mais de 27 anos de prisão, nem que a ofensiva dos corruptos reais e potenciais seja derrubada de fato. Se tomarmos de conjunto o último período desde a eleição de Lula contra Bolsonaro, o movimento social e a esquerda conseguiram um empate importante nas ruas e têm todas as condições de virar o jogo. Mas a luta será dura: a extrema direita conta não somente com o governo do país mais poderoso do mundo tomando medidas consecutivas contra o Brasil, o governo e o Judiciário brasileiro, mas também com uma carta eleitoral nada desprezível na manga – um “Bolsonaro domesticado”, um neofascista de humor controlado, em pele de bom administrador, que é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.


A situação exige que a mobilização de rua continue. O que é um desafio, já que, a princípio, essa pauta está enterrada e nenhuma outra tem a mesma adesão de setores da mídia empresarial, ainda que possam ter apelos de massa, como a escala 6x1, a isenção de Imposto de Renda até 5 mil e a tributação dos super ricos. E essa deve ser nossa aposta que hoje se materializa no Plebiscito Popular!


Outro desafio, é que essa posição mais à esquerda do governo, pautada pela extrema direita e o imperialismo, contraditoriamente se dá no mesmo contexto em que o petismo se repactua com setores da elite econômica, em especial a agrária exportadora. 


A história demonstra que num contexto de arrefecimento da extrema direita, a estratégia conciliatória do petismo tende a ganhar força e comportamentos como o de parte da sua bancada votar pautas do centrão passará a ser cada vez mais constante, inclusive pelo executivo (a exploração de petróleo na margem equatorial, segue como uma ameaça concreta). Nesse sentido, é papel da esquerda radical, seguir resguardando sua autonomia -  a possível ida de Boulos ao Ministério vai na contramão disso. Ao mesmo tempo que precisamos seguir na aposta das mobilizações de rua e na organização popular nas redes e territórios, para seguir derrotando a extrema direita e pautando o governo para reformas estruturantes. A defesa da soberania nacional ganha centralidade, mas para nós socialistas, é fundamental aproveitar a defesa de que o Brasil trilhe seu próprio caminho, para fazermos uma discussão de modelo de desenvolvimento, numa perspectiva ecossocialista. 


Insurgência Reconstrução Democrática e Rebelião Ecossocialista


 
 
 
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