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    Insurgência Reconstrução Democrática
  • 30 de abr.
  • 4 min de leitura

Em 5 de abril, nos Estados Unidos, 1.300 manifestações envolvendo 500.000 pessoas expressaram uma ampla indignação contra Trump e seu governo de extrema direita. Essas mobilizações, significativas, mas ainda em estágio inicial, mostram que é possível responder aos ataques violentos perpetrados ao redor do mundo contra os interesses dos trabalhadores e trabalhadoras, migrantes, vítimas de opressão racial, mulheres e comunidade LGBTI.


Na Sérvia, Grécia, Coréia do Sul, Turquia, Grã-Bretanha, Alemanha, Argentina e Índia, setores significativos da população também se mobilizaram contra seus governos e contra a extrema direita, colocando muitos desses governos em apuros. A juventude desempenhou um papel fundamental em todas essas lutas e resistências. O amplo movimento de solidariedade ao povo de Gaza contra o genocídio imposto pelo estado sionista, que mobilizou centenas de milhares de jovens, muitos deles de origens racializadas em países imperialistas (incluindo judeus antissionistas), mostra o caminho a seguir na mobilização contra as ofensivas imperialistas e da extrema direita. Este movimento fortalece a solidariedade com a resistência ucraniana contra a invasão russa, a resistência do povo Kanak contra o imperialismo francês e todas as outras formas de solidariedade e resistência antifascista e anti-imperialista.


O 1º de maio 2025 é uma oportunidade para demonstrarmos nossa solidariedade internacional com as lutas contra as políticas belicistas, a extrema direita, contra as políticas neoliberais e pelos direitos democráticos, econômicos e sociais da população. A bandeira palestina tremulará como símbolo da resistência em todo o mundo.


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O mundo se tornou ainda mais instável, incerto e perigoso. Devemos enfrentar a emergência climática e a crise econômica, social e política engendrada pelo capitalismo. As políticas autoritárias e xenófobas-protecionistas de Putin e Trump, e as guerras imperialistas e comerciais que estão travando, estão aprofundando a crise deste sistema. As medidas de Trump agravam a crise econômica e causam mais inflação e demissões, além de reforçar o extrativismo ecocida e imperialista. Governos autoritários, imperialistas ou subimperialistas, como os de Trump, Putin, Netanyahu, Meloni, Orbán, Erdogan, Modi, Xi Jinping e Marcos estão conduzindo os ataques. Simultânea e articuladamente, com base em seu conservadorismo reacionário, estão multiplicando ataques contra os direitos sociais e democráticos, bem como contra os direitos reprodutivos das mulheres, pessoas LGBTI, particularmente pessoas trans, contra as liberdades de imprensa e expressão, contra migrantes e todas as camadas racializadas da população — que estão sofrendo crescente discriminação, ilegalidade, separação familiar, prisão e deportações.


Diante dessa situação, a Quarta Internacional afirma a necessidade urgente de lutar pela mais ampla liberdade de circulação de pessoas e trabalhadores, para que possam se estabelecer onde escolherem, com igualdade de direitos, independentemente de nacionalidade, origem, gênero ou sexualidade. A Quarta Internacional exige o congelamento de preços e o aumento de salários, o cancelamento de dívidas ilegítimas e a expropriação de bancos e grandes empresas de energia.


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A resposta às políticas belicistas de Trump e Putin, que estão tomando forma no genocídio na Palestina e na invasão da Ucrânia, bem como em suas tentativas de chegar a um acordo para dividir a riqueza ucraniana, não pode ser o militarismo. A União Europeia tenta se organizar para formar um terceiro polo econômico e militar com base em uma corrida precipitada em direção belicismo e a políticas de austeridade antissociais. Ela usa o pretexto de responder a Putin e Trump para aumentar os orçamentos militares. Afirma que, para isso, são necessários cortes drásticos nos gastos sociais — em hospitais, escolas, pensões e aposentadorias, servidores públicos e, claro, ajuda aos países do Sul, como Trump fez. Essa política está repleta de ameaças à humanidade, seja pelas guerras, incluindo a guerra nuclear, seja pela ascensão do neofascismo ao redor do mundo e sua rejeição aberta à luta contra a crise climática.


Assim, a Quarta Internacional convoca um movimento global contra as guerras, a militarização e contra as armas nucleares. Este movimento não entra em conflito com o apoio à luta armada e desarmada dos povos contra as guerras imperialistas, particularmente na Palestina e na Ucrânia, mas de todos os povos submetidos ao imperialismo e às potências regionais no Congo, Sudão, Sahel, Curdistão, Armênia, Iêmen e Mianmar. Ao contrário, os fortalece. Porque não pode haver paz sem justiça.


É preciso urgentemente construir outro mundo baseado na cooperação e não na violência, na socialização (de recursos naturais, transporte, bancos) e não na competição, em decisões democráticas sobre o que produzir e quais bens circular, na solidariedade e não no ódio incentivado pela extrema direita. Na vanguarda do enfrentamento a esse grande desafio estão aqueles que lutam contra a extrema direita, contra os governos liberais, contra a guerra, pela libertação da Palestina e da Ucrânia. A Quarta Internacional expressa isso em seu manifesto pela revolução ecossocialista, adotado em seu 18º Congresso.


Neste 1º de Maio, convocamos os trabalhadores e trabalhadoras, camponeses e camponesas, moradores e moradoras de bairros pobres e todos os povos e setores oprimidos a se mobilizarem massivamente para mudar o mundo. Diante da ascensão da extrema direita e das políticas autoritárias de todos os governos, a Quarta Internacional clama pela construção de campanhas unificadas em resposta ao imperialismo belicista, ao neofascismo e ao neoliberalismo. Vamos mudar a correlação de forças!


• Solidariedade internacional contra o imperialismo e o autoritarismo no dia 1º de maio, dia histórico de resistência e solidariedade internacional!

• Pelo fim das guerras e da militarização. Que as tropas sionistas saiam dos territórios palestinos e que as tropas russas se retirem da Ucrânia!

• Enfrentemos a extrema direita em todo o mundo!

• Defendamos as reivindicações dos trabalhadores e trabalhadoras, povos e setores oprimidos, em direção à revolução ecossocialista!


Declaração do Birô Executivo da Quarta Internacional

28 de abril de 2025 



O ano de 2025 desenha um cenário de ascensão alarmante da extrema-direita global, com o crescimento do conservadorismo e do autoritarismo como fendas para emergência do fascismo. A vitória de Trump nos Estados Unidos tensiona as forças da direita para a sua expressão mais austera para o mundo. A saída da OMS e o rompimento do Acordo de Paris, que se somam à ofensiva contra mulheres, pessoas LGBTQIAPN+, imigrantes e tantas outras, são apenas a ponta do iceberg do programa daqueles que, por trás, gerem as nossas realidades: bilionários como Elon Musk, Jeff Bezos e Mark Zuckerberg e suas big techs, petroleiros, armamentistas e outros setores da grande burguesia. Junto à eleição de Trump, a vitória de Milei na Argentina e a derrota histórica da social-democracia na Alemanha refletem a reorganização da extrema-direita e a guinada política em direção ao autoritarismo, sinalizando a consolidação do projeto neoliberal em escala mundial, o que deve ser encarado em tom de alerta por toda a esquerda.


No Brasil, o bolsonarismo segue atuante, vivo e mobilizador, com influência significativa na sociedade e nas instituições. De igual modo, as contradições do governo Lula 3, que aposta equivocadamente na governabilidade conciliadora e na ausência de mobilização, seguem sendo uma corda ao nosso pescoço: seja pelo perdão de dívidas milionárias para os super-ricos e concessões ilimitadas ao agronegócio, seja pela austeridade fiscal penalizante à classe trabalhadora, são nítidos os acenos do atual governo aos setores econômicos do andar de cima e, portanto, seu distanciamento frente ao projeto eleito nas urnas que nós, esquerda radical, defendemos. Seus limites tornam-se ainda mais estreitos frente ao poder crescente do Congresso Nacional, essencialmente conservador, turbinado por emendas parlamentares. O Centrão que o comanda carrega, na verdade, o programa da extrema-direita e com ela flerta, como ficou visível nas últimas eleições.

        

Neste cenário de múltiplas crises, vivemos, pois, a pouca iniciativa para reverter retrocessos dos governos anteriores como a reforma trabalhista e o aprofundamento da uberização do trabalho. Enquanto o mundo desmorona ao nosso redor, o discurso liberal - que encontra nas redes sociais privilegiado impulsionador - oculta as reais motivações de tais fissuras, introjetando uma sensação de impotência, que nos faz acreditar que sucesso ou fracasso são responsabilidades individuais. As grandes potências imperialistas sempre financiaram guerras e desestabilizaram economias para garantir sua dominação; hoje, valem-se também da tecnologia da informação para controlar nossa realidade, criando mundos paralelos que distorcem nossa percepção da realidade.


Simultaneamente, enfrentamos uma emergência climática sem precedentes, cujos desdobramentos se diferenciam a partir de recortes de classe, gênero e raça, vitimizando, especialmente, as populações pobres e periféricas. A COP 30, que será sediada no Brasil neste ano, trará ao centro do debate as mudanças do clima e o financiamento de ações para enfrentá-las. Desde já, cabe refletirmos e respondermos aos impasses que nos cercam, entre eles as divergências do governo federal e de setores ambientalistas quanto ao papel da Amazônia na produção energética do país. Como ecossocialistas, nos guiamos pela premissa de que  não há conciliação possível entre a preservação ambiental e a lógica de exploração desenfreada e, por  isso, defendemos uma transição energética justa - que respeite os territórios, os povos e as comunidades tradicionais -, e o decrescimento econômico das grandes potências - visto serem as principais responsáveis pela crise climática.


Diante da atual conjuntura no Brasil e no mundo, cabe às esquerdas se respaldarem, de forma estratégica, no enfrentamento da extrema-direita e no reconhecimento da gravidade das crises econômica, política, climática e ecológica, apresentando soluções concretas para os problemas da classe trabalhadora. Nesse sentido, é fundamental apostar no fortalecimento das mobilizações sociais. A demanda da conjuntura é intransigente: não podemos nos restringir ao formalismo da democracia liberal, pois o capitalismo, com sua lógica de acumulação de riqueza, perpetua os privilégios dos super-ricos, enquanto as camadas populares enfrentam um cotidiano marcado por preços elevados de alimentos essenciais, empregos precarizados, aumento insuficiente do salário mínimo e um acesso limitado à saúde pública, educação de qualidade e outros serviços básicos, todos comprometidos pela imposição do teto de gastos.


É urgente adotar medidas que solavanquem as causas estruturais da exploração e da desigualdade. Não podemos permitir que a extrema-direita seja a protagonista das respostas a esses desafios e conduza a narrativa deste debate. A reorganização das lutas pela redução da jornada de trabalho, com o fim da escala 6X1, é um exemplo de proposta necessária para o retorno do diálogo das esquerdas com a classe trabalhadora. Se a direita mobiliza a partir de mentiras e inseguranças, devemos articular a população com pautas concretas de melhoria da qualidade de vida, como uma reforma agrária agroecológica capaz de tirar do agronegócio o poder de encarecer e envenenar a comida que chega aos nossos pratos. 


Para viver sem medo, é necessário acreditar no mistério da persistência humana — como afirma Galeano —, essa força inexplicável que nos faz continuar lutando por um mundo que seja casa de todos, e não o inferno da maioria. É preciso politizar o tempo, buscando, mesmo nesta difícil conjuntura, abrir espaço para a construção de outra sociedade.


Estamos vivendo no fio da navalha da história, um momento decisivo, cercado por múltiplas crises, desafios imensos e grandes responsabilidades para a classe trabalhadora e os movimentos populares. A história mostra que transformações reais nascem da mobilização coletiva. Por isso, agora, mais do que nunca, é tarefa das esquerdas revolucionárias continuar ocupando as ruas e fazer dela ferramenta para a subversão quotidiana!

 

  1. O papel da União Nacional dos Estudantes (UNE) diante da crise climática e a disputa por seus rumos

 

A União Nacional dos Estudantes (UNE) tem uma trajetória de luta e resistência que se entrelaça com a própria história das lutas sociais no Brasil. Fundada em 1937, a entidade nasceu do ímpeto coletivo de uma juventude disposta a se organizar para transformar a realidade, protagonizando importantes capítulos da história do país, como a criação da Petrobras, o combate à ditadura empresarial-civil-militar e a luta pela redemocratização. Sua atuação não se restringiu apenas ao campo político-institucional, mas também foi decisiva na consolidação da educação pública, gratuita e de qualidade e na democratização do acesso à cultura e à arte popular – apostando na transformação da realidade por meio do teatro, da poesia, da música e da educação popular.


Ao longo de seus 88 anos, a UNE se consolidou como uma trincheira fundamental de organização estudantil e de articulação entre as juventudes e os movimentos populares, contribuindo para a construção de projetos de sociedade que colocam o povo como sujeito coletivo capaz de transformar o país e que articulam educação, cultura, direitos humanos e soberania popular. A entidade esteve presente nas grandes jornadas de luta dos estudantes, como as campanhas contra a redução da maioridade penal, a luta pela conquista das cotas, a ocupação das universidades contra a PEC do Teto de Gastos, as mobilizações pelo Fora Cunha e a resistência contra os cortes na educação durante os governos Temer e Bolsonaro. Mais recentemente, cumpriu um papel importante na derrota eleitoral de Bolsonaro em 2022, colocando a força da juventude na disputa por um projeto de reconstrução democrática do país.


Em um contexto de crises múltiplas – política, social, econômica, ambiental e civilizatória – o papel da UNE permanece sendo estratégico para a mobilização e disputa política no Brasil. A entidade é a frente única mais antiga e enraizada no movimento estudantil brasileiro. No entanto, o peso da história não pode justificar a paralisia diante dos desafios do presente. Se o mundo atravessa uma crise civilizatória profunda, marcada pela emergência climática, pelo aprofundamento das desigualdades e pela ascensão da extrema direita global, a UNE precisa se colocar à altura dessas batalhas.


A emergência climática impõe à nossa geração a responsabilidade de reimaginar o papel da entidade e recolocá-la como ponta de lança na luta por justiça ambiental e contra o colapso ecológico. É inadmissível que o governo eleito com o trabalho da juventude aceite a exploração de petróleo na Amazônia ou repita o modelo desenvolvimentista que devasta territórios, envenena rios e destrói modos de vida em nome do lucro. A defesa da vida, da Amazônia e dos povos que a protegem deve ser prioridade absoluta, lutando contra a especulação imobiliária e seu impacto em territórios tradicionais e nas áreas verdes das grandes cidades. Não há futuro possível se não enfrentarmos as causas estruturais da crise climática e a lógica predatória do capitalismo.


A UNE que queremos é aquela que enfrenta o desenvolvimentismo predatório, que denuncia os acordos inescrupulosos entre governos e grandes corporações, que defende a redução da jornada de trabalho e o decrescimento econômico das grandes potências. Uma UNE, portanto, que compreende que não há futuro possível sem justiça climática, e que a disputa pelo presente precisa ser feita com a urgência de quem sabe que a vida está em jogo.


O tempo histórico que atravessamos exige mais do que a defesa de direitos conquistados: exige a coragem de disputar novos horizontes para a nossa geração e de apontar para uma sociedade onde a vida valha mais do que o lucro. A UNE tem todas as condições para cumprir esse papel – mas para isso precisa romper com a lógica de conciliação e voltar a ocupar as ruas, as universidades e os corações da juventude que sonha e luta por um outro mundo possível.


As contradições que permeiam os rumos da UNE refletem também em suas disputas internas. A pluralidade e a diversidade das juventudes brasileiras se expressam nos diferentes projetos políticos que coexistem na entidade. No entanto, a hegemonia de décadas do grupo majoritário – liderado por PCdoB, PT e aliados – tem resultado no sufocamento de divergências e na falta de articulação e mobilização concreta nos últimos dois anos. Embora tenham havido avanços pontuais, como a inclusão da independência política na resolução do 59º CONUNE e a crítica ao pacote econômico do governo federal, pela falta de mobilização efetiva, tais compromissos ainda não se traduziram em ação.


A greve universitária de 2024 evidenciou essa contradição. A ausência de uma mobilização de peso da UNE para organizar a luta e o posicionamento de setores majoritários contra a greve demonstraram uma desconexão com as bases estudantis. Não há unidade real quando divergências são reprimidas e quando a entidade se distancia das necessidades da classe trabalhadora e da juventude.


Alguns setores insistem na conciliação de classes e em um desenvolvimentismo que ignora os impactos sociais e ambientais da exploração da natureza. Essas propostas não enfrentam as estruturas de desigualdade e perpetuam um modelo colonial e excludente. Podemos construir alianças táticas em pautas comuns, como a luta contra a extrema direita, mas sem ilusões: a transformação radical da sociedade exige um movimento estudantil independente, combativo e comprometido com mudanças estruturais. 


Ou seja, a UNE precisa resgatar seu papel histórico de organização da luta estudantil e popular, fortalecendo a mobilização nas universidades e nas ruas. Diante da crise climática, da precarização da educação e do avanço da extrema direita, não há tempo para hesitação. O futuro depende da capacidade de organização da juventude, e a UNE tem o dever de ser parte desse processo – não como espectadora, mas como protagonista.

 

  1. Sobre a Juventude Sem Medo e suas tarefas:

 

A Juventude Sem Medo surge da confluência de diversas juventudes a partir da plataforma Vamos! e da construção da candidatura de Guilherme Boulos (MTST) e Sônia Guajajara (APIB), em 2018. Impulsionada pela Frente Povo Sem Medo, construímos um acúmulo programático que respondia aos desafios históricos do país, algo que não encontrávamos plenamente no campo majoritário nem em setores da oposição.


Por décadas, a UNE foi marcada por uma polarização entre a majoritária e a oposição de esquerda, muitas vezes esvaziada de debate e ações reais. Reconhecemos o papel histórico da oposição de esquerda diante dos governos do PT, mas é necessário refletir sobre seus erros. Esse campo adotou leituras equivocadas da conjuntura, métodos autoritários e práticas contraditórias - como o sufocamento de minorias -, refletindo uma cultura política violenta, stalinista e sectária. Essa crítica, no entanto, longe de se restringir à oposição de esquerda, se estende, em dada medida, à majoritária, que perpetua a lógica de poder a qualquer custo.


A Juventude Sem Medo nasce para romper com essas estruturas, trazendo uma nova cultura política ao movimento estudantil. Inspirados na educação popular, nas lutas antirracistas, ambientais e urbanas, buscamos construir um campo alternativo, que se comprometesse com a transformação radical da sociedade. Desde o CONUNE de 2019, inovamos ao lançar uma candidatura coletiva à diretoria da UNE, representando um projeto negro, feminista e LGBTQIAPN+. Durante a pandemia e os atos Fora Bolsonaro, priorizamos a unidade da esquerda para enfrentar a extrema direita, sem abrir mão do nosso programa político.


No entanto, as recentes movimentações da Juventude Sem Medo colocam em risco sua missão histórica. A aproximação de alguns coletivos da JSM com a UJS e o campo majoritário da UNE, apoiando resoluções que defendem o desenvolvimentismo e mascaram a inércia da entidade no último período, contradiz nosso compromisso ecossocialista e de independência em relação aos governos. As diferenças na UNE vão além da tática; são estratégicas. Esse movimento de adesão atende tanto a interesses internos do PSOL quanto à lógica de conciliação política do PT/PCdoB, enfraquecendo a autonomia da UNE em um momento de intensas contradições no governo e necessidade de mobilização social.


A JSM foi criada para disputar a política da UNE com independência, apostando na mobilização estudantil para barrar a extrema direita e fortalecer as lutas. No 16º CONEB da UNE, aprovamos um plebiscito popular pela redução da jornada de trabalho, contra a escala 6x1 e pela taxação dos super-ricos, defendendo, ainda, que a emergência climática deve ser o epicentro de nossos enfrentamentos. Mas, para que tais resoluções saiam do papel, a UNE precisa verdadeiramente organizar e mobilizar as juventudes, respaldando-se no entendimento de que nossa resistência deve se dar pela luta coletiva dos explorados e oprimidos.


Em meio ao aprofundamento das crises e da destruição dos nossos territórios, não há mais espaço para paralisia. Ou construímos uma alternativa radical, comprometida com uma nova forma de fazer política, ou ficaremos presos à ilusão do poder institucional, que nunca nos serviu. Por isso, reafirmamos nossa disposição para encontrar saídas coletivas, mas não podemos justificar uma possível adesão da JSM ao campo majoritário como algo positivo. Esse cenário seria um retrocesso e comprometeria a autonomia da Juventude Sem Medo como alternativa independente de governos e dedicada à organização estudantil. Chamamos à reflexão coletiva e seguimos militando na construção de caminhos que fortaleçam nosso programa político, sem nos render às ilusões do campo majoritário. É hora de sonhar mais alto!

 

 

Assinam esse texto:


Bruna Souza Jacob - Ex diretora da UNE (2017/2021)

Jessica Rebouças - Ex diretora da UNE (2019/2023)

(Ambas fazem parte da Coordenação Nacional de Juventude da Insurgência Reconstrução Democrática - Organização Interna do PSOL e da IV Internacional.)

 

 


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    Insurgência Reconstrução Democrática
  • 12 de fev.
  • 7 min de leitura

A COP 30 em Belém, Brasil, no coração da floresta amazônica, pode dar início a um salto de qualidade na luta de massas, a única maneira de desbloquear as batalhas ecológicas, sociais, anti-imperialistas e ecossocialistas


Os movimentos sociais, ambientais e anti-imperialistas de todas as partes enfrentam o desafio de se organizarem como um movimento global contra a destruição do clima e da biosfera pelo capitalismo. As COPs do clima foram sequestradas pelos interesses fossilistas, as COPs da biodiversidade encontram-se paralisadas e 15 milhões de km2 de solos já foram desertificados ou degradados, agora ao ritmo de 1 milhão de km2 por ano. 2024 foi o ano mais quente em 120 mil anos, com o acréscimo de 3,6 partes por milhão de CO2 na atmosfera, o maior já registrado em um ano, 425,38ppm) e temperaturas 1,5oC mais altas do que a do período pré-industrial. Sem mudanças radicais, seguramente ultrapassaremos um aquecimento de 2oC antes de 2050. Constatamos, assim, a falência dos tratados firmados em 1992 no Rio de Janeiro contra a desestabilização do clima, a perda da biodiversidade e a desertificação, do Acordo de Paris de 2015 que buscava limitar o aquecimento global a 1,5oC e dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, adotados no mesmo ano.

 

O cenário ambiental catastrófico vem sendo agravado pelas dinâmicas políticas. Conservadorismos nacionalistas, fundamentalismos religiosos e neofascismos vêm avançando através da polarização contra a ordem globalista. A economia pós-2008 assiste aos processos simultâneos de reafirmação e radicalização da ortodoxia neoliberal e crescimento do protecionismo; a crise pandêmica, ela própria resultante do desequilíbrio no metabolismo entre sociedade e natureza, teve um profundo efeito desorganizador sobre as cadeias globais de produção. As grandes corporações e potências dobram a aposta na inovação tecnológicas - em tecnologias digitais demandando quantidade absurdas de energia, como as inteligências artificiais, mas também em tecnologias de sequestro de carbono irracionais, justificação para manterem o status quo fossilista. Deslocamentos geopolíticos acirram as disputas entre imperialismos e subimperialismos e geram guerras devastadoras; os gastos militares disparam por todas as partes. As pressões vorazes da economia mundial se multiplicam e, na periferia do sistema, as demandas neoextrativistas e neocoloniais formam zonas de sacrifício de povos e territórios. Quer-se que tudo seja privatizado e apenas as finanças globais sejam levadas em conta nas políticas ambientais globais, através da criação de “mercados de carbono”. Nada disso contribui para enfrentarmos as crises ambientais; mesmo as políticas de “transição energética” previamente pactadas tem se revelado muito frágeis.

 

Agora, com a eleição de Trump, racismo, xenofobia e intolerância se somam ao fossilismo e ao negacionismo da ciência ditando a política no coração do capitalismo. O novo governo dos EUA já ameaça promover anexações territoriais ao estilo do “big stick”, indicando que atuará como um estado “fora da lei”, ao arrepio do ordenamento jurídico internacional que Washington estabeleceu depois da II GM. Trump retirou novamente os EUA dos acordos climáticos, combate as propostas de transição energética e promete a expansão ilimitada da extração dos combustíveis fósseis. No combate às formas contemporâneas do fascismo, a luta anti-imperialista mais clássica se torna inseparável da luta ambiental.

 

Catástrofes com grande visibilidade vem se multiplicando em número cada vez maior a cada ano: Derna na Líbia, Porto Alegre no Brasil, Valência na Espanha são apenas os exemplos mais recentes. O maior impacto, porém, se dá sobre as populações rurais e as periferias das grandes cidades, sobre os pobres, as mulheres, crianças e idosos, as populações racializadas, os mais vulneráveis... A poluição do ar é a segunda causa de mortalidade no mundo, vitimando anualmente mais de 8 milhões de pessoas. Embora pouco tratada pela imprensa, a grande seca que se abateu sobre a Amazônia em 2023/24 produziu impactos duradouros para toda a humanidade, aproximando esse bioma estratégico do Sistema Terra, já fragilizado pelo desmatamento, de seu ponto de inflexão (“tipping point”), no qual a Floresta colapsa. Alguns dos principais cientistas do clima nomearam seu relatório sobre o estado do clima de 2024 de “Tempos perigosos no planeta Terra”. Só podemos reafirmar seus diagnósticos e alertas gravíssimos!

 

Os setores informados da população sabem que o “sistema” está semeando tempestades; os setores críticos sabem que o responsável por isso tem nome: capitalismo. A competição pela acumulação, a ganância pelo lucro a qualquer custo, a lei do valor, atingiram uma escala em que se tornou incompatível com o respeito aos tempos da vida e aos limites dos sistemas naturais do planeta. Um capitalismo verde é impossível. Livre mercado e governos corrompidos por empresários nos colocaram nesse desastre. O anticapitalismo contemporâneo também tem nome: ecossocialismo. Não há futuro para a civilização e a biosfera da Terra sem o encontro das lutas socioambientais com uma nova forma de organização socialista da humanidade. Avançar nesse projeto exige reconquistar a independência política dos explorados e oprimidos e soldar as lutas sociais, ambientais e anti-imperialistas em novos patamares de coerência, organização e mundialização.

 

A COP 30, em novembro, em Belém, oferece uma oportunidade única para isso. Trata-se de um evento que ocorrerá no Brasil sob o governo Lula e em uma capital localizada na Floresta Amazônica. Já há uma articulação unitária do conjunto dos movimentos sociais brasileiros para organizar, em antecipação e em paralelo à COP 30, uma Cúpula dos Povos. Há uma enorme carência de espaços abertos e unitários de encontro e expressão do conjunto dos movimentos sociais (como foram os Fóruns Sociais Mundiais) e essa aspiração está sendo canalizada para Belém.

 

As condições são particularmente favoráveis. A Amazônia foi a única região que manteve uma tradição regular de organizar Fóruns Sociais Panamazônicos a cada dois anos; o X FOSPA, de 2022, foi em Belém e o XI, de 2024, em Rurrenabaque na Bolivia. Junto com a Assembleia Mundial pela Amazônia (AMA), a Rede Eclesiástica Panamazônica (REPAM) e a Coordenação da Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (COICA), os FOSPAs alimentaram uma dinâmica supranacional de encontros dos movimentos indígenas e sociais da região, construindo relações de confiança, uma agenda comum radical de combate ao extrativismo e a violência que o acompanha. E forjaram laços com o movimento climático mundial.

 

O XI FOSPA produziu, em junho de 2024, “Um chamado da Amazônia para construir um Acordo para a vida face ao colapso climático e ecológico”, que parte da consigna clássica do movimento climático, “mudar o sistema capitalista, não o clima”, para chamar a constituição, ao redor de uma plataforma de dez pontos, de uma coalizão global em defesa do clima e da vida. Essa articulação já tinha se reunido em Belém, em agosto de 2023, quando da Cúpula dos Presidentes da Panamazônia, e voltou a se reunir em Yasuni, no Peru, em agosto de 2024, durante a COP 16 de biodiversidade, em Cali, na Colômbia, em outubro, e no Rio de Janeiro, em novembro, quando se produziu uma proposta de acordo entre os movimentos das florestas tropicais. Um seminário internacional para perfilar a trajetória final para Belém foi marcado para São Paulo, em fins de maio de 2025. Além disso, o I Encontro Ecossocialista da América Latina, (realizado junto com o VI Encontro Ecossocialista Internacional), reunido em maio, em Buenos Aires, marcou seu próximo ponto de encontro em Belém, nos dias que antecedem a COP 30. Vamos buscar expressar, em um espaço autônomo em Belém, a Cúpula dos Povos, a conflitividade social e política e as iniciativas de articulação necessária para reconstruir um poderoso movimento climático mundial.

 

O espaço aberto dos movimentos sociais em Belém é também a oportunidade para impulsionarmos outra iniciativa estratégica, uma dinâmica de encontros antifascistas, agora tornada mais candente pela posse do governo Trump e sua política nacionalista reacionária. Originalmente planejado para ocorrer em maio de 2024 em Porto Alegre, o I Encontro Antifascista teve que ser adiado pela catástrofe climática que destruiu a região. Mas sua necessidade é maior do que nunca. Realizá-lo este ano dispersaria forças que devem convergir na convocação para Belém. Mas devemos aproveitar Belém para organizar um pré-encontro capaz de alavancar a realização, no primeiro semestre de 2026, do I Encontro Internacional Antifascista.

 

Não se trata, sobre a COP 30, de ter qualquer ilusão de que as negociações internacionais entre os estados produzirão, no atual cenário, em que o fossilismo foi reforçado pelas vitórias de Trump nos EUA e o crescimento da extrema-direita na União Europeia, um acordo que atualize as metas de emissão nacionais ou requalifique o processo de negociações climáticas (cada vez mais percebidos como inseparáveis das referentes à biodiversidade e à desertificação). O desafio inicial, da parte dos movimentos dos trabalhadores e setores populares, é fazer convergir as lutas socioambientais em um movimento internacional capaz de construir confrontos de uma qualidade superior.

 

Não devemos minimizar as dificuldades que nos esperam. Belém não é Porto Alegre e a COP 30 não é um Fórum Social Mundial. A cidade é uma das capitais estaduais do Brasil com infraestrutura urbana mais precária e a estrutura hoteleira já está bloqueada pelo governo brasileiro para a COP 30. O presidente Lula já indicou como presidente da COP o embaixador André Corrêa do Lago, um veterano negociador climático, que entretanto atuará constrangido pela correlação de forças adversa do executivo federal brasileiro - onde o agronegócio, o fossilismo e o extrativismo têm peso determinante. Os governos federal, estadual do Pará e municipal de Belém estão alinhados e já sinalizaram que buscarão reduzir a participação social durante o evento da COP. Mas não estamos estabelecendo objetivos impossíveis: Belém já recebeu, em 2009, um FSM com mais de cem mil participantes. Os movimentos sociais de Belém e da Panamazônia acolherão de braços abertos aqueles que vierem se solidarizar com suas lutas, estratégicas para todo o mundo.

 

Os militantes da IV Internacional no Brasil, atuando em suas distintas organizações, devem convergir seus esforços e, em sintonia com aqueles de outros países, viabilizar que Belém seja um espaço aberto para os movimentos, as trocas políticas e a organização de campanhas. Precisamos dar concretude ao nosso “Manifesto do Marxismo Revolucionário na Era de Destruição Ecológica e Social Capitalista”. O convite a Belém é o chamado à um salto de qualidade na luta de massas, única forma de destravar a luta ecológica, social e anti-imperialista, a luta ecossocialista!


Insurgência Reconstrução Democrática, MES, Rebelião Ecossocialista, Ana Cristina Carvalhaes, Cheron Menezes e João Machado, miembros del CI. Allan Coelho, Antônio Mota Filho e Fernanda Mallafati, militantes de Centelhas e Michael Löwy.

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