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PL da Devastação: como o Congresso e o governo entregaram o meio ambiente ao capital predatório

  • Foto do escritor: Insurgência Reconstrução Democrática
    Insurgência Reconstrução Democrática
  • 5 de jun.
  • 3 min de leitura
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Por Felipe Velloso


A mineração em terras indígenas, a exploração de petróleo na sensível foz do Amazonas, o avanço de grandes projetos sobre territórios tradicionalmente protegidos – essas ameaças concretas ao patrimônio natural brasileiro estão perigosamente próximas de se materializar. O gatilho para essa escalada de risco foi puxado pelo Senado Federal com a aprovação do projeto que flexibiliza radicalmente o licenciamento ambiental, impulsionado pela controversa emenda do senador Davi Alcolumbre. Sob o véu enganoso de promover o "desenvolvimento" e a "agilidade burocrática", este projeto representa um dos mais severos retrocessos na política ambiental das últimas décadas. O núcleo do problema reside no desmonte sistemático de salvaguardas essenciais: empreendimentos de médio porte, como barragens e obras de saneamento, poderão avançar sem a devida e rigorosa análise dos órgãos competentes, ignorando lições cruciais de tragédias anunciadas como Mariana e Brumadinho.


A criação de uma licença especial para "empreendimentos estratégicos", ideia capitaneada por Alcolumbre, escancara as intenções por trás do projeto. Esta brecha jurídica, aparentemente técnica, funciona na prática como um salvo-conduto para que grandes interesses econômicos – mineração, petróleo, agronegócio expansionista – se sobreponham às necessidades de preservação e aos direitos das populações tradicionais. Trata-se de uma legalização da precarização ambiental, onde o rótulo de "estratégico" serve como passe livre para ignorar estudos de impacto, violar territórios indígenas e quilombolas, bem como acelerar processos que deveriam ser submetidos ao crivo científico e social. A medida despreza solenemente os riscos ecológicos e as vozes das comunidades mais vulneráveis, revelando uma clara priorização de agendas setoriais e acordos políticos, em detrimento da sustentabilidade e da justiça socioambiental.


A postura do governo federal diante desse desmonte legislativo é tão alarmante quanto o próprio projeto. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, encontrou-se isolada e fragilizada em sua defesa intransigente dos princípios ambientais, enquanto o Palácio do Planalto adotou uma posição de omissão calculada. Essa neutralidade cúmplice permitiu que a bancada ruralista e aliados como Alcolumbre – cujos vínculos com setores econômicos ávidos por menos regulação são notórios – impusesse sua agenda predatória sem resistência efetiva do Executivo. O silêncio do governo não só desarma sua própria autoridade ambiental (que importante lembrar, nunca entregou o projeto de autoridade climática), mas também contradiz frontalmente compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, como o Acordo de Paris, e desrespeita decisões centrais do Supremo Tribunal Federal (STF) que reafirmam a obrigatoriedade do licenciamento robusto.


Essa falta de coesão governamental expõe uma fragilidade política perigosa: em vez de liderar a transição ecológica que prometeu, o governo Lula optou por negociar com os agentes da devastação em nome de uma governabilidade cada dia mais frágil. O resultado é uma incoerência flagrante: como pode um governo que se apresenta como campeão do clima na cena internacional permitir a aprovação de um projeto que inviabiliza suas próprias metas de desmatamento zero até 2030? Essa contradição atinge seu ápice às vésperas da COP30, que será sediada em Belém, e joga todos os holofotes nas políticas ambientais de seu anfitrião.


As consequências desta capitulação se estenderão muito além das esferas ecológica e política. Ao facilitar a invasão de terras indígenas e quilombolas, o projeto alimentará conflitos fundiários e ampliará a violência rural, já em níveis intoleráveis. A destruição acelerada de biomas críticos como Amazônia e Cerrado desestabilizará ainda mais os regimes de chuvas, agravando crises hídricas e energéticas que afetarão cidades e lavouras. Economicamente, a imagem de "produto sujo" associado ao desmatamento trará sanções comerciais e perda de mercados exigentes, prejudicando até mesmo setores do agronegócio que dependem da reputação internacional. O mito de que a flexibilização ambiental gera prosperidade é desmentido pela história recente: tragédias humanitárias, passivos bilionários e danos irreversíveis comprovam que o caminho do atalho regulatório leva ao abismo socioeconômico. Há uma década estamos presenciando a morte do Rio Doce, um dos mais importantes do país.


O PSOL, ao lado das comunidades atingidas, movimentos sociais e outros aliados, tem o enorme desafio de ser uma voz dissonante no Congresso Nacional, para tentar brecar o projeto que agora voltará a Câmara dos Deputados. A COP30, em Belém, deve se tornar um palco global para expor este retrocesso e pressionar por sua reversão. O chamado "PL do Licenciamento" não é um simples ajuste normativo – é um atestado de rendição do Estado brasileiro aos interesses mais retrógrados e predatórios. Aceitá-lo sem luta é pactuar com a autodestruição do país, e, mesmo, de todo planeta. O verdadeiro desenvolvimento exige não menos, mas mais proteção ambiental – e essa verdade precisa ecoar mais alto que o ruído do progresso fictício.


Felipe Velloso é militante da Insurgência Reconstrução Democrática.

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